«Amanhã», Documentário de Cyril Dion e Mélanie Laurent

A Educação - uma linha de montagem

Este texto foi redigido na sequência do visionamento do documentário “Amanhã”, de Cyril Dion e Mélanie Laurent. Este documentário encontra-se dividido em cinco capítulos: 1-Agricultura; 2-Energia; 3-Dinheiro; 4-Democracia; 5-Educação.  O tema que escolhi foi a Educação e pretendo falar sobre o modelo de ensino que se pratica, o qual está muitas vezes desajustado da realidade e da vida da sociedade atual.

As crianças vão para a escola para se prepararem para a vida real que está a mudar muito rapidamente. Contudo, o ensino tem evoluído muito pouco ao longo dos anos. O tipo de ensino praticado até aos dias de hoje foi concebido na Revolução Industrial para formar trabalhadores para as fábricas e são os valores associados à Revolução Industrial que determinam, atualmente, um dos problemas do ensino. As crianças são ensinadas em salas de aula, onde se encontram dezenas de alunos com diferentes paixões, diferentes visões para o futuro, mas ensinadas por um único professor. O ensino continua muito centrado no professor a ensinar e não no aluno a aprender. A vida dos alunos é governada pelo toque de uma campainha; os alunos têm mais de 20 horas de aulas por semana, o que dá uma média de mais de quatro horas por dia, com pequenos intervalos; têm de estar todos sentados, virados para a frente; têm de levantar a mão se quiserem falar; têm de fazer trabalhos de casa, cumprindo prazos limitados no pouco tempo livre que já têm. Durante todo o dia os alunos apenas seguem instruções tais como: sentem-se, estejam calados, abram o livro na página 80, façam este exercício. Estes são valores da Revolução Industrial que já não se aplicam aos dias de hoje onde o mais importante é a criatividade, a capacidade de comunicar e a colaboração com os outros. Nas escolas, as crianças são como objetos numa linha de montagem, em que entram todas diferentes e, ao fim de um processo em que andam todos à mesma velocidade e são bombardeados com a mesma quantidade de cada disciplina, saem do outro lado como uns autómatos.

Acho que, de todas estas características que deviam mudar, a mais preocupante é o  horário. Como é que é suposto um aluno que passou a semana toda, de manhã e de tarde, na escola, chegue ao fim da semana e tenha vontade de estudar alguma coisa? Não só acho que o horário semanal é demasiado grande como acho que a duração de cada uma das aulas também o é. Por exemplo, nas faculdades é de prática comum haver aulas de duas e três horas. Há mesmo alguém que acredita que um ser humano consegue estar atento durante todo esse tempo? Talvez ainda pior sejam as horas a que começam as aulas. Estudo após estudo mostra que dormir um número mínimo de horas é essencial para a saúde e desenvolvimento dos jovens. Por isso, não só para o bem das notas dos alunos, mas para a sua saúde mental, as aulas deviam mesmo começar mais tarde. Por mais que as pessoas se tentem distanciar da sua condição animal, é um facto que precisamos de comer, de dormir, que não conseguimos estar quietos e atentos durante longos períodos de tempo. Infelizmente, no sistema atual de ensino, estas necessidades continuam a ser ou parcialmente negadas ou completamente ignoradas.

Outro problema é a falta de autonomia dos alunos que apenas têm de seguir regras e instruções e esta é uma das causas que leva ao aborrecimento e desmotivação. Por outro lado, o ensino baseia-se principalmente na memorização de conteúdos e este tipo de conhecimento não é fiável, pois é rapidamente esquecido. Mas é este tipo de conhecimento que é avaliado nos testes, o que leva os alunos a passarem muito tempo a memorizar para depois conseguirem boas notas, pois a avaliação é que é importante e não o conhecimento. Uma das perguntas mais frequente feita pelos alunos é “Isto vai sair no teste?”, o que mostra a importância que dão à avaliação e não ao conhecimento em si. Assim, a avaliação é muitas vezes desmotivante para alunos e professores. Mais do que desmotivante, este tipo de avaliação está a canalizar o tipo errado de pessoas para certas profissões. Tomemos como exemplo um médico ou cientista. Estes deveriam ser pessoas inventivas, criativas, com capacidade crítica. No entanto, o sistema de ensino atual está a canalizar o tipo oposto de pessoas para estas profissões: pessoas que conseguem memorizar e debitar grandes quantidades de conteúdos.

Os alunos, sendo seres humanos, têm interesses e capacidades diferentes e, no entanto, são ensinados todos da mesma maneira, com os mesmos recursos e estratégias e ao mesmo ritmo. Por isso, dentro de uma turma, existem alunos aborrecidos por já dominarem os conhecimentos que estão a ser explicados e outros ficam desmotivados por não conseguirem sequer acompanhar o ritmo do professor. Os alunos que não atingem os níveis esperados sentem-se uns falhados, quando, com mais algum tempo ou diferentes estratégias, podiam atingir o nível desejado.

Nos dias de hoje, o uso de internet permite o acesso a todo o tipo de informação de uma forma muito rápida. Contudo, o recurso às novas tecnologias é pouco utilizado, não só pela sua falta nas salas de aula, mas também porque se entende que estas prejudicam a aprendizagem favorecendo a distração dos alunos.

Constata-se também que há pouca diversidade de áreas oferecidas (música, dança, teatro, expressão plástica, estão ausentes na “formação geral” da escolaridade obrigatória) e valoriza-se muito as disciplinas teóricas como matemática, português, história. O saber académico é mais valorizado do que o saber fazer. Acontece que o mercado de trabalho já valoriza bastante uma integração entre os conceitos que o aluno aprende e a sua capacidade de aplicar esses conceitos no trabalho quotidiano e, no futuro, essa será uma habilidade cada vez mais necessária, uma vez que o mundo do século XXI é inconstante e exige dos cidadãos do futuro um conhecimento mais interdisciplinar. O currículo tradicional em que cada disciplina existe separadamente já não faz sentido.

Também é relevante o facto de, frequentemente, os edifícios escolares serem pouco atrativos e não favorecerem um ensino diferente. Compare-se, por exemplo, uma sala de aula de uma escola atual com a de uma escola do século XIX. Praticamente nada mudou, apesar do que se pretende atualmente com o ensino ser bastante diferente. Talvez mais preocupante seja quando se compara as instalações de algumas escolas com uma prisão e se constata que as diferenças entre elas são demasiado poucas. As escolas deviam estar extremamente bem equipadas uma vez que é nas escolas que se formam cidadãos e que o ensino se torna muito mais fácil, tanto para os alunos como para os professores, quando se tem as condições necessárias. Ora, por exemplo, na Finlândia investe-se muito nos edifícios escolares, mesmo em comunidades mais pobres, com o objetivo de mostrar a importância da educação na formação dos cidadãos.

Felizmente que ao longo da história existiram várias personalidades que, não sendo alunos exemplares, conseguiram destacar-se pelos seus feitos. Por exemplo, Einstein começou a falar e a ler mais tarde que o normal e, na escola, foi expulso pela sua rebeldia; Churchill e Steve Jobs não passavam de alunos razoáveis; Newton não era um aluno brilhante; Abraham Lincoln, não teve um ensino regular, mas era autodidata; Henry Ford não teve um ensino formal; George Washington, Thomas Edison também não foram bem sucedidos na escola. Acredito que estes casos são exceções que confirmam a regra de um modelo de aprendizagem escolar que prepara os alunos mais para o passado do que para o futuro.

Infelizmente, acho que atualmente se pode provar bastante facilmente que o modelo de ensino não está a dar os frutos desejados. Como posso afirmar tal coisa? Bem, olhe-se para onde se quiser no mundo e assistimos a um apoio crescente aos regimes totalitários, ao fascismo, ao descrédito na ciência, ao crescimento das chamadas religiões “new age”, das teorias da conspiração… Isto não deveria estar a acontecer no século XXI. Acho que isto é um indicador forte de que o sistema de ensino tem de mudar, rápida e drasticamente.

Mas tudo isto pode mudar se quisermos…

Cada aluno devia ter um ensino ajustado ao seu ritmo, com professores e outros técnicos que os ajudassem a evoluir e a atingir os seus objetivos. A escola devia proporcionar aos alunos uma maior diversidade de conhecimento, tanto artísticos como os necessários ao dia a dia - cozinhar, costurar, trabalhar a madeira, como mostrava o documentário. Assim, os alunos não só teriam mais opções para fazerem escolhas futuras como estariam mais bem preparados para a vida. Atualmente, os alunos saem da escola sem saberem minimamente como funcionam os bancos, a bolsa, a política, as relações internacionais. Por exemplo, acho que em História se devia dar muito mais ênfase ao período pós-11 de setembro, à Guerra ao Terror, assim como problemas que ainda hoje existem, como o conflito israelo-palestiniano ou os refugiados, uma vez que todos eles têm uma grande influência na política atual. Como é que é suposto as pessoas saberem em que partido votar, partidos estes que geralmente têm uma posição bastante clara quanto a estas questões, se nem sequer sabem de que se tratam estes problemas?

A aposta nas tecnologias devia ser uma realidade das escolas. A redução do horário, da quantidade de “matéria”, de trabalhos de casa ajudaria à obtenção de maior rendimento por parte dos alunos. Valorizar mais o conhecimento e não os resultados nas avaliações faria com que houvesse menos alunos e professores desmotivados.

Pelo mundo, já existem escolas que praticam um ensino diferente e bem sucedido como podemos ver no caso da Finlândia. Em Portugal, algumas escolas também já praticam um tipo de ensino semelhante onde “o aluno tem uma atitude mais ativa na procura do conhecimento”, como acontece na Escola da Ponte, em Santo Tirso. Outro exemplo é a Escola Básica de Fonte Santa, no agrupamento da Marinha Grande Poente, um dos sete agrupamentos do Projeto Piloto de Inovação Pedagógica (PPIP), que, atualmente, tem 2800 alunos distribuídos entre a educação pré-escolar e o 12.º ano. Neste projeto, as escolas tornaram-se espaços abertos de aprendizagem, onde os alunos também se ensinam uns aos outros. Contudo, para que todas a escolas adotassem estes modelos, era necessário um grande investimento na educação, não só a nível material, mas principalmente na preparação dos professores e técnicos e em políticas de educação estáveis e consensuais e que a sociedade valorizasse mais a educação.

Gonçalo Sousa, 

(texto escrito em maio de 2019 e revisto em 2021)

Referências:

https://idocode.com.br/blog/educacao/problemas-na-educacao-atual/

https://www.tsf.pt/sociedade/educacao/interior/alunos-portugueses-tem-demasiadas-horas-de-aulas-10450766.html

https://www.youtube.com/watch?v=okpg-lVWLbE

https://canalhistoria.pt/blogue/biografia-thomas-edison/?cli_action=1558560542.332

https://www.publico.pt/2014/11/24/sociedade/reportagem/escolas-que-questionam-o-sistema-convencional-e-dao-a-cada-aluno-o-seu-tempo-1677221

https://observador.pt/especiais/nem-chumbar-nem-passar-a-unica-alternativa-nesta-escola-e-aprender/


Dinheiro: Uma proposta diferente

Não é uma novidade que o nosso planeta, Terra, está a caminhar na direção de um futuro com condições inabitáveis para nós, humanos. As temperaturas têm subido cada vez mais ao longo dos anos, assim como a bióloga Elizabeth Hadly diz no documentário “Amanhã”. A espécie humana nunca experienciou temperaturas tão altas quanto as que estão para vir nas próximas décadas, o que é extremamente preocupante. O aquecimento global é real. A extinção de milhares de espécies está também a acontecer por todo o mundo, inclusive em Portugal, que é um dos países da Europa com mais animais em via de extinção.

A existência de biodiversidade é o que nos dá as condições necessárias à sobrevivência e, no entanto, estamos a matá-la, a vendê-la, a abusar dela. Negócios como a venda de chifres de rinocerontes ou de peles de animais selvagens, a indústria da carne, a exploração florestal e qualquer outra atividade económica que se aproveite da natureza apenas para gerar dinheiro (a lista podia continuar por muitas páginas), estão a destruir o planeta. Por exemplo: o Peru perdeu quase 2 milhões de hectares de floresta amazónica em 15 anos; os rinocerontes são sacrificados para a transformação dos seus chifres em joias pelos traficantes. Tudo isto devido à ganância dos poderosos, principalmente, mas também de toda a gente, pois queremos sempre mais. Mais “joias”, mais riqueza, mais poder, mais dinheiro.

Quando no século XX se deu a Revolução Industrial e também se implementaram modelos como o Taylorismo e o Fordismo, ou seja, a estandardização – processo que facilita a produção em massa - começou uma era, que dura até hoje, de produção excessiva. Este fenómeno tem muitas consequências como o crescimento das importações/exportações e, consequentemente, a desvalorização de mercados locais. Para além disso, o comércio internacional também tem um custo ambiental elevado devido à natureza poluente do transporte das mercadorias. Segundo o documentário já citado anteriormente, nos Estados Unidos da América, os alimentos fazem um percurso de cerca de 2400 km desde o local de produção até ao de consumo.  De acordo com a notícia “UE quer limitar emissões de CO2 dos camiões”, os transportes pesados são responsáveis por quase 20% das emissões de dióxido de carbono.

É um facto que 71% das emissões para a atmosfera de gases poluentes estão concentradas em apenas 100 empresas. No topo estão empresas que exploram energias fósseis como o petróleo, o carvão e o gás natural as quais contribuem extraordinariamente para a degradação de ecossistemas tanto terrestres como aéreos e aquáticos. O petróleo serve não só para alimentar “máquinas” como também para produzir plásticos, fibras sintéticas e outros materiais que são dos maiores responsáveis pelo lixo encontrado nos oceanos que não é biodegradável. As grandes empresas petrolíferas são um pilar da economia globalizada e, assim, de um modelo de capitalismo que estimula o consumo excessivo e os consequentes desperdício e poluição.

Em suma, o capitalismo e a globalização e todos os fatores com eles relacionados, já mencionados antes, são o que está a desenvolver esta crise ambiental, económica, política e social.

Temos então de encontrar soluções para o controle desta catástrofe aparente que se está a desenrolar. No documentário “Amanhã” de Ciryl Dion e Mélanie Laurent, são abordados cinco temas - Agricultura, Energia, Dinheiro, Democracia e Educação e eu escolhi focar este texto no “Dinheiro”.

Neste momento, existe uma “monocultura económica” pois todas as moedas espalhadas pelo mundo são do mesmo tipo.  No entanto, como já disse anteriormente, a existência de biodiversidade é o que nos dá as condições necessárias à sobrevivência. O mesmo acontece na economia agora: o sistema económico estabelecido por todo o mundo é frágil por não ter essa diversidade tão necessária. A ideia proposta é, então, criar várias moedas locais/sociais.

As moedas sociais são uma alternativa às grandes moedas, como o dólar ou o euro, e circulam apenas dentro da comunidade que utiliza a referida moeda, ou seja, esta só tem valor entre um conjunto de pessoas específico. Este sistema reduz o consumo de produtos gerados por empresas multinacionais e estimula e valoriza, portanto, os mercados locais. Como?

Imaginemos um café, um cozinheiro com um restaurante e uma empresa de plantação de cereais e todos pertencem à comunidade que utiliza a moeda local da cidade e vamos chamar à moeda: “Cant”. O vendedor do café compra com Cants um bolo ao cozinheiro do restaurante; o cozinheiro compra os cereais necessários à empresa local de plantação, também com Cants; e mais tarde, quando os agricultores da empresa saem do trabalho, dirigem-se ao café para lanchar, pagando este com Cants. Desta forma, a moeda circulou localmente, ninguém teve de recorrer a empresas multinacionais e todos os pequenos negócios da cidade foram valorizados.

Para além disso, não foi preciso importar e, portanto, poupou-se uma pequena percentagem de emissões de gases poluentes para a atmosfera. É esta pequena percentagem que faz a diferença, aos poucos vão-se aliando mais cidades a esta ideia, seguindo o exemplo, e, passado uns anos, certamente que a poluição atmosférica já terá diminuído significativamente. E ainda se dará a diminuição da produção em massa e, consequentemente, também da poluição pelas grandes empresas pois estas já não vão ser tão requisitadas pelas necessidades de consumo das populações.

Alguns exemplos de cidades/países onde este modelo já foi adotado são a Suíça (moeda WIR) e a cidade de Bristol em Inglaterra (libra de Bristol- na imagem). Estes casos são provas vivas de que este sistema é possível e efetivamente cumpre os objetivos estabelecidos e melhora a qualidade de vida da comunidade. Para que este tipo de moeda seja implementado em maior escala por diversas populações do planeta é necessário haver pequenas iniciativas de grupos de pessoas em cada cidade ou região. Concluindo, é importante a divulgação desta alternativa às grandes moedas e a explicação do porquê desta mudança poder ser tão benéfica.

                                                                                            Catarina Moniz, 2019

Webgrafia:

https://vimeo.com/251289725

https://www.theuniplanet.com/2017/05/peru-perdeu-2-milhoes-hectares-floresta-amazonica.html (consulta a 19-05-2019)

https://www.dw.com/pt-002/chifres-de-rinocerontes-transformados-em-j%C3%B3ias-pelos-traficantes/a-40568390 (consulta a 19-05-2019)

http://www.circulaseguro.pt/mobilidade-sustentavel/ue-quer-limitar-emissoes-de-co2-dos-camioes (consulta a 19-05-2019)

https://observador.pt/2017/07/12/71-das-emissoes-de-gases-com-efeito-de-estufa-sao-provocadas-por-apenas-100-empresas/ (consulta a 25-05-2019)

https://wrm.org.uy/pt/artigos-do-boletim-do-wrm/secao1/petroleo-um-pilar-da-expansao-do-capitalismo/ (consulta a 25-05-2019)




  
Trailer de «Amanhã» de Cyril Dion e Mélanie Laurent, legendado em português